Nos EUA, o premiado Syrah vale 55 dólares. No Brasil, pode custar cerca de 280 reais.
Quem viaja para o exterior sabe bem que comprar vinho nos Estados Unidos, na Europa ou mesmo em países vizinhos do Brasil pode ser bastante vantajoso. Preços acessíveis e rótulos de qualidade lotam gôndolas, seja em pequenos armazéns ou grandes supermercados. Ao retornar para casa, é sempre a mesma decepção. O mesmo rótulo que no exterior era uma barganha sai no país por uma pequena fortuna.
Há anos, o consumo de vinhos finos está estagnado no Brasil, sem conseguir ultrapassar a insignificante marca de dois litros per capita por ano. De acordo com Júlio Fante, presidente do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), 70% correspondem ao consumo de vinhos populares.
Comparando com países vizinhos, a quantidade consumida em todo o Brasil é pífia. No Paraguai, país sem qualquer tradição no setor vitivinícola e terra do mate, o consumo é de quase 5 litros por ano. Até mesmo no Vaticano se consome mais vinho que o Brasil. Lá, aproximadamente 66 litros da bebida de Baco passam pelo gargalo das garrafas em direção às taças do alto clero.
Um peso no orçamento dos brasileiros, vinhos importados encaram duras barreiras tributárias para passar pela fiscalização dos portos até que, por fim, consigam entrar em território nacional. Os altíssimos impostos pagos pelos rótulos associados à falta de conhecimento dos brasileiros sobre a bebida, por ainda considerarem capricho de elite ou de difícil paladar, impactam negativamente no consumo da bebida no Brasil e complicam a expansão.
Para se ter uma ideia, de acordo com números do Instituto Brasileiro de Pesquisa Tributária (IBPT), a carga tributária total que incide sobre o preço de uma garrafa, produzida fora do Brasil e da zona de influência do Mercosul, é responsável por 83,4% do preço pago pelo consumidor final. Por incrível que pareça, o peso dos impostos nos importados é muito maior do que o que incide em armas de fogo, por exemplo, cuja carga tributária gira em torno dos 65% de seu valor final.
“Enquanto na Espanha o vinho é considerado complemento alimentar, no Brasil ele sofre tratamento tão duro quanto de armas”, lamenta Ciro Lilla, proprietário de uma das maiores importadoras do país, a Mistral, e considerado uma das pessoas mais influentes do mercado do vinho no Brasil.
Uma garrafa de vinho importado carrega o peso do IPI, ICMS, COFINS, tributos sobre salários, IRPJ, CSLL, além do Imposto de Importação. “Isso sem contarmos frete internacional, que ainda pode chegar a 27%, e taxas burocráticas, referentes à entrada de contêiners no porto de Santos, que é um dos mais caros do mundo”, contabiliza. Ou seja, vinhos importados pagam os mesmos impostos dos vinhos nacionais, além de outras despesas de transporte e afins. O que pode fazer com que uma garrafa qualquer chegue no Brasil valendo quatro vezes mais do que no exterior.
Nem mesmo para os vinhos nacionais existe qualquer incentivo fiscal que ajude a aguçar o paladar do consumidor e o leve a comprar uma garrafa para experimentar. De acordo com números do IBPT, no preço final de um vinho produzido em solo brasileiro, cerca de 64% é puro imposto.
Países signatários do Mercosul levam uma pequena vantagem em todo esse processo. Acordos alfandegários permitem que vinhos provenientes do Chile ou Argentina não paguem o imposto de importação, que, sozinho, é responsável por cerca de 20% de toda a carga incidente. E é por este motivo que os vinhos sul-americanos chegam ao país custando o mesmo, ou algumas vezes pouco mais, que os exemplares brasileiros.
Concorrência
Pois há quem diga que é preciso aumentar, ainda mais, os tributos para os exemplares importados, uma vez que são erroneamente, segundo especialistas, considerados concorrentes diretos dos vinhos brasileiros. Se existem representantes da indústria nacional a favor de um aumento dos tributos como maneira de incentivar a produção e o consumo cada vez maior dos rótulos nacionais, Lilla é taxativo e acha incabível a hipótese de que um rótulo possa concorrer com outro. “Vinhos são como obras de arte, livros ou mesmo filmes. É impossível de comparar um com outro”, diz.
Além disso, há o lado positivo de se ter uma vasta gama de uvas, safras e vinícolas diferentes, independentes da procedência, disponíveis para a compra no Brasil. Alexandra Corvo é professora de sommellerie e experimenta, anualmente, cerca de 1.500 rótulos nacionais e internacionais. Ela acredita que o acesso aos importados deve ser visto como um estímulo para o desenvolvimento do setor no país.
A indústria vitivinícola nacional, de qualidade, explica ela, é jovem demais e precisa amadurecer. “Se não fosse pela abertura de mercado, o Brasil ainda estaria produzindo vinhos inexpressivos como antigamente”, explica a sommelière ao comentar a ideia de que vinhos importados são vistos como concorrentes dos nacionais. “O vinho brasileiro tem mudado para melhor, mas não vejo motivo para considerar um concorrente do outro. Cada região tem seu estilo”.
Alexandra faz parte do coro de consumidores assíduos da bebida que lamentam os altos preços pagos por vinhos no Brasil , os quais considera “abusivos e absurdos”.
Mais custos
No ano passado, Guido Mantega, Ministro da Fazenda, anunciou uma medida que trouxe ainda mais lenha para a fogueira da indústria vitivinícola nacional: a adoção de um selo fiscal, cujo objetivo é controlar a relação do produtor ou importador com o fisco, esquentando ainda mais o debate acerca dos altos valores pagos por uma simples garrafa de vinho no país. A partir de janeiro de 2011, todos os vinhos devem vir com o selo que indica que o pagamento do IPI foi devidamente realizado.
Grandes representantes da indústria nacional se posicionaram a favor da medida, sob a justificativa de que iria coibir o contrabando e organizar o setor. Do outro lado, importadores e pequenos produtores de todo o país consideram a adoção da medida um retrocesso.
Lilla é um dos porta vozes do lado contra a aplicação da medida. Ele considera um lobby de grandes produtores gaúchos para atrapalharem ainda mais a chegada de vinhos importados ao país, favorecendo então os vinhos nacionais. Mas não necessariamente o aumento do consumo da bebida no país ou tornando o acesso à garrafas de diferentes vinícolas mais acessíveis ao grande público.
“Empresas nacionais contam com linhas mecanizadas de engarrafamento. Portanto, a aplicação do selo gera um custo de quase nada para eles”, explica. O problema vai ficar na mão dos pequenos produtores, que terão de aplicar na mão, tornando o processo de rotulamento mais lento e trabalhoso, e dos importadores, que terão de abrir caixas delicadas para a aplicação do selo, produzido em papel moeda, nos próprios armazéns, ao custo de trinta centavos por garrafa. É importantíssimo frisar que um contêiner contendo uma bebida produzida de maneira tão artesanal quanto o vinho deve ser refrigerado, com a temperatura ambiente rigorosamente controlada.
Por outro lado, representantes da indústria nacional, como a Ibravin, que acreditam o selo é uma maneira eficiente de controlar o contrabando, falsificação e sonegação dos impostos no setor, além de evitar a adulteração da bebida. Segundo Fante, o selo exige mão de obra e pode aumentar um pouco o custo, no entanto, é preciso de uma ferramenta que coloque o parreiral em ordem.
Postado por: Rodrigo cacholi (taberna)
fonte: http://pordentroenahora.blogspot.com.br